No meio da noite eu acordei apertado para ir ao banheiro. Odeio quando isso acontece! Abri o olho, afastei as cobertas de cima do corpo e, ao mesmo tempo que me pus sentado na cama, abri os olhos. Só aí notei que havia alguém me observando. Um fantasma.

Na hora eu me assustei com a presença inesperada, mas nada mais do que aquele pequeno espanto de quando uma criança te pega desprevenido na curva do corredor com o típico berro que só elas sabem dar. Depois desse meio segundo nos olhamos fixamente, olho no olho. Não sei dizer como sabia que não era um assaltante (vivo) ou alguém querendo meu mal (vivo ou morto). Sei que não senti ameaça emanando do espírito, só um pequeno incômodo de como me fitava profundamente, mas sem nenhuma expressão no rosto.

Resolvi ignorá-lo e fui ao banheiro, despreocupado. Ao abrir a porta, lá estava ele dentro do box. Me olhando. Fixamente.

A propósito, é horrível relaxar para mijar com alguém te olhando daquele jeito. Acho que nunca tinha me concentrado de fato para conseguir urinar.

Voltei para o quarto e a criatura estava lá de novo, na mesma posição em que a vi da primeira vez. Estática, a não ser pela cabeça e pelos olhos, que me seguiam. Deitei, me cobri e virei de costas para aquilo. Como há muito não acontecia, demorei a pegar no sono, em um misto de desconforto pelo Big Brother sobrenatural e a dúvida do que queria.

De manhã cedo, ainda lá. Enquanto me arrumava para trabalhar, ainda lá. No ônibus e no metrô apertados, lá. Atrás de mim enquanto eu executava minhas tarefas no escritório. Ao lado do meu colega, quando ele se sentou na minha frente para almoçarmos. E até o fim do dia assim.

Ele não andava, simplesmente aparecia no novo cenário para onde eu ia, sempre a me observar, inerte. Teve até certa parte do dia em que pensei que ele se tornaria paisagem, como aquele quadro que fica tanto tempo na parede que você nem se dá mais conta que ele está lá. Estranhamente, minha mente fazia questão de me lembrar do fantasma a todo momento em que eu ameaçava esquecer que ele estava ali.

Assim foi por dias. Vários. Às vezes até em meus sonhos. Eu já nem sabia se era ele ou minha cabeça pregando peças.

Até que ele se expressou. Aliás, ela. Esqueci de comentar, era o espírito de uma mulher. Eu tinha a sensação de que a conhecia, mas não sabia dizer de onde. Ela se expressou quando eu abracei uma menina em uma festa e a beijei. Ela piscou. Uma piscada demorada, ao menos para o tempo normal de uma piscada. E foi como se tivesse disparado uma espingarda de sal grosso na direção do meu peito, que sentiu aquele impacto disperso e começou a arder muito depois. Ela ocupava todos os espaços da minha cabeça enquanto os lábios da moça real ocupava os espaços do meu corpo. Eu já não saberia dizer mais qual das duas beijava e preferi me embebedar para, se não afastá-la, ignorar o fato de estar fazendo a mais absoluta confusão entre realidade e fantasia perturbada.

A moça com quem estava na festa me convidou para ir a seu quarto de hotel e, sem condições de avaliar com critérios o que estava fazendo, aceitei prontamente. Não sei dizer como cheguei lá, porque apenas tenho flashes do restante da madrugada.

O quarto era amplo e bonito, em se tratando de um quarto de hotel. A cama era confortável e, deitado de costas, lembro de um corpo nu feminino vir por cima do meu, largado de costas ali. A fantasma observava tudo, também nua, sentada na beirada do colchão. A menina controlava a ação com maestria, bastante à vontade em se satisfazer comigo bêbado. Era tudo meio nublado, interrupto, faltando pedaços. Até eu sentir três mãos me alisarem. Quatro em seguida.

A fantasma estava em cima de mim, e a garota ao meu lado. Eu acho. Não sei. Uma sorria e a outra gemia de prazer. Ela me puxou e se deitou, me pondo por cima. Enquanto ela me abraçava nas costas, roçando os seios em mim e falando besteiras ao pé do meu ouvido, ela por baixo, me incitava a continuar a transa. Nada ali fazia sentido. Era tudo tão real quanto o sonho em que você cai de um prédio alto e sente o frio na barriga de verdade. Acorda com aquela sensação e pode jurar que aconteceu, se não fosse o fato de estar são e salvo em sua cama, suado no meio da noite. Em algum momento disso, eu gozei e dormi.

Na manhã seguinte, só havia uma mulher comigo. A real. Eu me vesti e saí, e se ela me viu ir embora, não esboçou reação alguma. Não trocamos telefone, nem beijo de adeus; provavelmente nunca mais nos veremos. A fantasma, surpreendentemente, também foi embora. Também nunca mais a vi. Saí daquele hotel mudado. Estranho. Apaixonado. Pela fantasma.