Abro os botões da sua camisa para admirar seu corpo à luz da Lua. Há tempos que não faço isso sem que você reclame e acho que esta é a última oportunidade.

Sua pele brilha com a iluminação fraca que entra pela sacada. O relevo que as dobras da roupa fazem trazem os únicos traços de sombra sobre você neste cenário estranhamente sombrio e aconchegante.

Seu rosto parece relaxado, como se nada mais importasse, a não ser estar deitada aí. Ouso encostar meus lábios nos seus, sabendo que não é a mesma sensação de antes, mas com a esperança vã de ser correspondido.

Termino de puxar a camisa e passo à saia, também para tirá-la. Assim como na barriga, a pele alva das pernas me convida para algo que você não vai mais oferecer.

Penteio vagarosamente seus cabelos e a admiro de cima a baixo: os fios castanhos e lisos entre meus dedos, os olhos cerrados e serenos, os lábios perfeitos abaixo do nariz mais delicado que uma mulher já teve.

Um sutiã rosado de algodão cobre-lhe os seios, que ornam o resto do tronco em proporção ideal. A calcinha que veste é do mesmo tom, deixando marcada, evidente e provocante as curvas do quadril.

As pernas macias, de coxas delineadas e contornadas, completam o cenário que nem Da Vinci conseguiu sequer imaginar.

Espalho o óleo perfumado pelo seu corpo imaginando que pudesse aquecê-lo desta forma. Com a flanela mais macia, umedecida em água quente, retiro o excesso do bálsamo e a visto com seu vestido de gala preto. Agora, o contraste se faz mais evidente e sua beleza atinge o ápice.

Com um último beijo sobre os lábios já gélidos e outro na testa, ponho-lhe o véu sobre o rosto e transfiro seu corpo para o caixão. Seus pais e nossos filhos nos aguardam para lhe dar o último adeus, meu amor.