A próxima aula de História estava prestes a iniciar enquanto eu me ajeitava sobre a cadeira para receber a professora. A qualquer instante, um bolinho de queijo ambulante entraria pela porta carregando uma dezena de pastas azuis, uma caixa de lenços de papel (o pó de giz, dizia ela, atacava sua rinite) e um sorriso feio pra burro. Um par de palitos de dentes, fantasiados de pernas, carregava o agrupamento roliço e sem forma de mulher. Mas, enfim, eu estava lá pra aprender e não para ver um desfile.

Com essa expectativa montada, não é de se admirar que a gente se calou quando outro ser abriu a porta e se pôs dentro da sala. Silenciosa, tímida como se fosse uma intrusa, ela foi até a mesa de professor e levantou a cabeça para observar sua plateia. Os olhares em retorno mesclavam-se entre a surpresa, a desconfiança, a admiração e a curiosidade; não se via ali, contudo, um olhar de indiferença. Da minha parte, olhava com desejo…

Um desejo quase puro, adolescente, inexperiente, que não arde só na virilha, mas no estômago e atrás dos olhos. Que faz a mão suar um pouquinho e a perna sacudir ritmada e nervosa. Que faz os ouvidos se fecharem para as conversas paralelas e se voltarem para um só discurso. Que faz a boca ficar entreaberta contra a vontade. Um desejo bem singelo.

A mulher disse que se chamava Rita, comentou qualquer coisa sobre a nossa professora titular estar doente e iniciou a aula. O corpo era de uma mulher adulta e brasileira, que, de costas, me provocava arrepios na nuca. O braço erguido, branco e com algumas pintinhas, movimentava-se para escrever a matéria na lousa e o quadril contrabalanceava o esforço dos rabiscos. Era um rebolado diferente, sem ritmo certo, quase que um amontoado de sacolejos curtos, do comprimento de uma letra de mão. Uma ginga dura e hipnotizante.

Ela não virava o corpo todo para explanar o que acabara de escrever. Ficava de lado, no meio do caminho entre continuar de frente para a lousa e estar voltada para nós. Estranhamente, sua cintura parecia afinar nesse movimento e a coxa, guardada por uma saia social, saltava e parecia mais grossa e atraente. Me lembro de não gravar um “A” sequer do que ela dizia, vidrado nas formas arredondadas de cada conjunto: rosto, seios, quadril, coxas.

Com tudo escrito no quadro e metade do tempo transcorrido apenas, Rita pediu que a gente escolhesse um tema já comentado em aulas anteriores e relacionasse com o do dia. Claro! Como se eu tivesse ficado atento a algo do que fora dito nos últimos 25 minutos e, pior, fosse capaz de fazer uma redação com qualquer coisa que a Bolinha de Queijo contou nas últimas vezes em que ficou à frente da turma. É nesses momentos que a criatividade se faz presente, e, para ganhar tempo, resolvi chamar a professora.

Meu Deus! O seu perfume precedia sua presença próxima, e nem sei como se descreve um cheiro, mas pensa numa música romântica de MPB entrando suavemente pelo nariz e você vai ter uma ideia. Já bem perto, bem do meu lado, o que ela orientou foi em vão, coitada… Eu estava hipnotizado pelo decote não intencional que brotou na minha frente quando ela se abaixou para explicar melhor, quase aos cochichos, a proposta de trabalho!

E o resto da aula foi só de devaneios. Eu estava navegando pelas nuvens da fantasia, nadando a braçadas largas nas fontes da imaginação, sensualizando a professora sem as grandes malícias que só teriam vez ao entrar na faculdade. O período acabou, a mulher se foi e o professor Edson entrou em seu lugar com as hipotenusas, os quadrados dos catetos e as fórmulas de Báskara. Até hoje, algo me diz que aquela foi a aula da sétima série em que mais aprendi alguma coisa que ainda trago comigo.