Isa,

Quando você estiver lendo esta folha de caderno, provavelmente já estarei em algum lugar no meio do Atlântico e cada vez mais longe de casa. Meu voo parte às cinco da madrugada e fiz questão de que meu beijo na sua testa não tirasse você do mundo dos sonhos. Uma das imagens mais belas das minhas manhãs é seu rosto rendido a Morfeu à luz do abajur.

Há exatos três anos, você entrava por aquele corredor comprido, as lágrimas tentando estragar a maquiagem, o sorriso da verdadeira felicidade iluminando a passagem, o vestido branco como manda a tradição perfeitamente encaixado em seu corpo… Até aquele dia, achava que a palavra ‘amor’ fosse a mais bonita que já inventaram, mas vi que um simples ‘sim’ pode me pôr pisando em nuvens, como nunca havia estado antes.

Neste tempo, você foi minha companheira, minha pequena, minha confidente, minha censora, minha vigia, minha esposa, minha mulher! É até difícil conter a vontade de rir ao pensar que nos conhecemos em uma exposição de arte e escultura maia (inca, asteca, ianomami, sei lá). Acho que nunca cheguei a te contar que estava lá a contra-gosto, fazendo média com meu irmão… Só mesmo a melodia de fadas que saía dos seus lábios para me tirar do tédio, explanando a quem estivesse por perto a origem das peças, seus significados e todo o blablablá de que nunca fui fã.

Contigo, aprendi a apreciar vinhos, ler quadros, ouvir MPB, fumar e largar o vício. Contigo, descobri que a vida é muito mais do que fazer dinheiro 24 horas por dia. Contigo, entendi como o berro estridente de um bebê que respira pela primeira vez pode trazer um homem às lágrimas.

Depois de ler tudo isso, queria que você pegasse o Miguel do berço, desse-lhe um beijo e pensasse em nós. Não sinta minha falta, sinta minha presença pela casa. Ouça meu jeito barulhento e bagunceiro de mexer no armário, pragueje em voz alta ao ver que a toalha de banho ficou embolada sobre a pia do banheiro (juro que esta foi a única vez que fiz de propósito), deixe uma lágrima discreta pingar ao ver que há um botão de rosa sobre a roupa que você separou para usar hoje.

Eu te ligo assim que aterrissar em Londres. Chego de volta na sexta-feira à noite; confirmo o horário ao embarcar. Adoraria que você fosse me buscar junto com o Miguel.

Sim, eu te amo mais do que cabe em mim. Que nossos corações sejam um só mesmo depois que a última gota do mar se secar.

Um beijo,

Ulisses